Foi você quem me fez assim

Uma entrevista com “Zé da Lei”

Desde criança, sempre gostei muito de ouvir as histórias do povo de Pirajuí. Curioso, ouvia meus pais, tios e vizinhos conversando e ficava imaginando quem seriam as pessoas que eles tanto falavam e contavam os causos.

Uma personagem que me marcava muito, pela curiosidade do apelido, era o Zé da Lei.

Essa alcunha tem bons motivos: foi talvez o mais conhecido Comissário de Menores da história de Pirajuí. José Alves da Silva trabalhou no Fórum da cidade por quase 50 anos!!!

Nascido em Borborema, em abril de 1937, faleceu em Pirajuí no mês de abril de 2011, poucos dias após completar 74 anos de idade.

Começou a atuar na área da justiça em 1959. Além de Oficial de Justiça,  foi Comissário de Menores e, para os pirajuienses que viveram sua adolescência e juventude nos anos 1960 e 1970, Zé da Lei era bastante popular por suas rondas noturnas.

Para a manutenção da ordem, naquela época, ficava a procura de menores que estivessem perambulando após às 22 horas.

E com ele não tinha desculpas: sua atitude rígida é lembrada por quase todos que “iam para a balada” no período. Muita gente ficou sem ir ao cinema e  bailes por causa do “pente-fino” do Zé da Lei.

Como lembra o próprio na entrevista, em tom de brincadeira, “até filho de gerente” que estava aprontando, sofreu as consequências.

“Carnaval e cinema, com entrada permitida apenas para maiores de dezoito anos, se tivesse dezessete anos e onze meses, não entrava, de jeito nenhum.” – Zé da Lei 

 

A entrevista com Zé da Lei

No início dos anos 2000, na época em que já escrevia uma coluna no semanário O Alfinete, começamos uma experiência nova no extinto site Pirajui.com, do amigo Sandro Nunes de Oliveira – era o TufãoNet.

Tivemos a ideia de conhecer um pouco mais da história do Zé da Lei, para falar de sua biografia, na época em que atuava juntos aos menores do município. A série de entrevistas recebeu o título “Os linha dura” e também trazia a palavra do Sargento Dib, do Sebastião Azedo, do Orlando Zaniratto (Todos In Memoriam) e, também, do Edi Roberto Alves, o Didi. 

Detalhe: nessa época, há quase vinte anos, eu sequer sabia que o Sr. José era pai do Dr. Fernando, que eu já conhecia, nem do Flávio (meu amigo “Irla”) – ele teve 5 filhos –, ou mesmo avô da Isabela, que por sinal forneceu alguns dados biográficos para esse post.

Nós estávamos querendo conhecer um pouco mais do personagem Zé da Lei. Eu e meu primo Leonardo Cipriani fomos até a sua casa, o entrevistamos e fotografamos – naquela época que ainda se “revelava” as fotografias, rs. (Se eu encontrar as imagens volto a publicá-las aqui no Homem Benigno).

Abaixo estão algumas das perguntas e respostas que fizemos. A proposta em pauta era fazer um comparativo da violência que o país vivia nos anos 2000 com a do passado, dos dias em que ele lidava diretamente com esse assunto. As respostas são muito interessantes!

Qual a principal diferença em lidar com os jovens daquela época e os de hoje?
Por algum tempo fui Comissário de Menores e o que se via era uma situação mais fácil de se lidar. Havia um respeito maior para com os mais velhos. Hoje já nem existe mais respeito. Além de respeitar, as pessoas tinham medo das autoridades.

Como era a atuação de um Comissário de Menores naquela época?
Era bem diferente… O que não era permitido era seguido à risca, em todas as cidades da região. Carnaval e cinema, com entrada permitida apenas para maiores de dezoito anos, se tivesse dezessete anos e onze meses, não entrava, de jeito nenhum.

Zé da Lei
Zé da Lei em fotografia de 1987. Ele faleceu em 2011. (Fotos: Acervo da Família)



Qual a atitude mais drástica que você teve de tomar com quem lhe faltou respeito?
O máximo que podia fazer era efetuar a prisão do mesmo. Andava sempre acompanhado de policiais. Já levei preso muita gente que deu trabalho, teve até filho de gerente…

*
Ao término da nossa entrevista, lembro de ter comentado com meu primo que imaginava um interlocutor mais severo – até bravo, mesmo.

Mas, apesar do porte alto, o que Zé da Lei demonstrava era uma simpatia, quase que a de um vovôzinho. Afinal, não é qualquer um que recebe em casa dois malucos querendo ficar perguntando do seu passado, não é mesmo?

Acima de tudo, o saudoso José Alves da Silva se mostrava orgulhoso e apaixonado pelo ofício que desempenhou por quase meio século.

Na hora de preencher a ficha técnica para a reportagem, perguntamos se ele tinha um hobby, uma atividade de lazer. Zé da Lei respondeu: “a minha própria profissão”.

 

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Show do Roberto Carlos em Pirajuí nos anos 1970 – Homem Benigno

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