No dia 2 de janeiro de 1978, a população de Pirajuí recebia com muita tristeza a notícia de uma tragédia. A cidade estava de luto.
A pista simples da Rodovia Marechal Rondon (que viria a ter início nas obras de duplicação apenas na década seguinte) fazia mais uma vítima. Com seu fusca, dessa vez quem nos deixava, aos 24 anos, era o jovem Sadir Marlowe Bromati.
Na primeira vez que ouvi o falar do nome de Sadir Marlowe eu ainda era bem pequeno – talvez é uma de minhas primeiras lembranças de infância sobre a vida em Pirajuí.
Em meados dos anos 1980, a banda marcial da cidade, toda enfeitada, vestida a rigor, tocava aqueles instrumentos que eu nunca tinha visto em um desfile ao redor do Jardim. Ela levava o seu nome: Banda Sadir Marlowe de Pirajuí!
Mas essa vaga lembrança não é suficiente para o tamanho do nome de Sadir Marlowe para toda a cultura de Pirajuí.
Sadir foi um furacão musical. Um homem com ritmo nas veias, uma vontade louca de empreender, montar, armar instrumentos, afinar, ensaiar – se o assunto era música na cidade, tenha certeza, ele estava envolvido.
De suas mãos surgiram bandas marciais, instrumentos encostados ganhavam vida, pessoas eram incentivadas a tocar as partituras que ele arranjava (não se esqueça que a internet estava muito longe de se popularizar). E os eventos cívicos recebiam uma roupagem única, com sua música!
Mas não era só desses ritmos mais clássicos como as marchinhas que vivia Sadir Marlowe. Sua verve rockeira criou a até hoje lendária Banda Transa 6!
A lendária Banda Transa 6 de Pirajuí
Ouvir rock em Pirajuí sempre foi uma atividade um tanto solitária (acho que em cidades interioranas como um todo, né?).
Por isso, para quem, assim como a nossa turma, ficava pelas esquinas ouvindo um som mais pesado, o nome de Sadir Marlowe é sempre heroico e desbravador.
A Banda Transa 6 era um símbolo de uma era. Eles foram os representantes de Pirajuí da música dos anos 1960 e 1970. Beberam na contracultura até mesmo no visual. Vejam só essa “foto de divulgação” produzida provavelmente em um dos jardins da cidade.
Inicialmente, a banda se chamava Transa Som. Diante do sucesso e da boa repercussão do público, conseguiram até um empresário, de Bauru.
Conforme o sucesso e as apresentações da banda aumentavam, descobriu-se que, no mercado, já havia um conjunto sob esse mesmo nome. A partir daí mudava a nomenclatura e nascia a Transa 6.
A Transa 6 era presença marcante na vida noturna de Pirajuí – e imagino que na região também. Nas noites do então badalado Atlético Clube, dentre outros points da época.
Tinha uma energia muito própria: vários músicos passaram por diversas formações, através dos anos.
Dos que me lembro, ao lado de Sadir tocaram Toninho (trompete), Isaías da Caixa (baixo), Zezinho da Casa Moreira (meu tio, baixo), Ramildo Zancan (guitarra), Claudinho Antonio Cândido (guitarra e baixo), Mauro Messias (in memoriam, bateria) e tantos outros.
Do próprio repertório da Transa 6 eu tenho poucas informações – ao que me lembro, como certa vez me contou o amigo e grande influenciador Claudinho, havia a clássica Why Can’t We Be Friends como som de abertura – não a versão moderna do Smash Mouth, é óbvio, mas a versão hippie do War.
Abaixo outra foto da Transa 6: seria no palco do Atlético? Notem os instrumentos!
Dos fios de energia para os palcos
Convenhamos que música não era assim a melhor das carreiras profissionais para se seguir em Pirajuí – acho que ainda não é, rs!
Sadir Marlowe, apesar de respirar música desde jovem, prestou e foi aprovado em processo seletivo para a Companhia Paulista de Força e Luz.
Estava cursando a faculdade quando da ocorrência do acidente.
Muito jovem, sua despedida precoce deixou uma grande lacuna na cena noturna e cultural de Pirajuí. Agora sim, vocês já entenderam que a banda marcial Sadir Marlowe que eu cito no início do texto, era uma homenagem que a música local deixou ao homem que inspirava esse movimento.
Sadir nome do amor
Chiquito Bromati teve quatro filhos: o primogênito Sadir, Heraldo, Francisco e a caçula Rousselana.
Prestes a ter o primeiro filho, Chiquito estava no aconchego de sua casa assistindo a um filme estrangeiro na televisão, em meados dos anos 1950.
Na TV, estava maravilhado e emocionado com a obra cinematográfica. O tocou tanto que decidiu batizar seu filho com o nome do filme: Sadir MARLOWE. Detalhe, o filme se chamava My Love!
DNA de músico na família
Que Sadir Marlowe foi símbolo de toda uma geração de amantes da música em Pirajuí, disso ninguém duvida. Sua morte precoce não apagou o seu papel e nem o quanto sua sensibilidade musical fez diferença na vida de toda uma cidade.
Anos depois, a vida daria provas do quão grande era o seu talento – de uma força quase sobrenatural.
Evandro Bromati, meu amigo e hoje residente em Campinas, era um bebê quando perdeu seu pai no trágico acidente. Casou-se com Carla Rodrigues (filha do genial Jota Rodrigues, saudoso homem da comunicação local) e tiveram o pequeno Heitor Bromati, hoje com 3 aninhos.
O neto de Sadir Marlowe, praticamente desde os dois anos de idade, é um aficcionado pela música. Interrompe tudo o que está fazendo para ouvir e admirar The Beatles, entre outros sons.
E, como veremos abaixo, desde pequenino, exibe para o mundo o dom de ser músico, com as baquetas de bateria nas mãos – já mostrei seus vídeos a bateristas veteranos e todos “enxergaram” ali um talento natural.
Dizem que a humanidade é cíclica. Quem o conheceu em vida, afirma na hora: é a paixão de Sadir Marlowe pelos instrumentos sendo eternizada e reverberada pelo seu lindo netinho. Assistam! Viva Sadir Marlowe!
Heitor “esmerilhando” na batera! Viva Sadir!