Na mesma época em que o jornalista Leandro Demori traz novo fôlego ao jornalismo de internet com seu magnífico artigo sobre o Trem Bala Brasileiro, o Homem Benigno se inspirou e resolveu não ficar parado: enviou no último domingo (17), o seu único e mais fiel correspondente, o encarregado Mauricio, para acompanhar um dia na vida do famoso Mascote da Festa da Mandioca de Pirajuí – figurinha que QUEBROU a internet em algumas ocasiões, como vocês bem podem conferir abaixo.
( ͡° ͜ʖ ͡°) Festa da mandioca em Pirajuí ( ͡° ͜ʖ ͡°)
— EMC (@elderc) July 5, 2013
Um dos mais comentados (e polêmicos) eventos da internet está de volta A FESTA DA MANDIOCA DE PIRAJUÍ pic.twitter.com/UUmFg4B7Fa
— funcionário Marcelo (@marceloindaniel) April 22, 2015
Frequentei a Festa da Mandioca de Pirajuí por muitos anos pic.twitter.com/i35h1lwjTx
— Doda (@dodavilhena) April 22, 2015
Curiosidades: a Festa da Mandioca de Pirajuí começou depois que o @marceloindaniel saiu em uma matéria no G1. pic.twitter.com/XmRODCqyYY
— Guilherme Medeiros (@guimedeiros) April 22, 2015
O resultado do trabalho de Demori foi a prova de que ainda há muito o que saber para podermos LER o Brasil dos dias de hoje. O resultado do trabalho do encarregado Mauricio foi uma dúzia de bolinhas de mandioqueijo.
Deliciem-se com este intimista diário narrado em primeira pessoa por ele próprio, o Mascote.
07:00
Já estou no terceiro copo de um café ralo, parecido com uma água de batata, mas nada parece afugentar o sono que toma conta de minh’alma. Foi uma longa noite arrumando tudo, preparando cada detalhe para que a festa fosse a melhor de todas, a mais inesquecível. Em dado momento da madrugada, tive uma discussão filosófica feia com as meninas da cozinha sobre o conceito do mandioqueijo. Estou me sentindo culpado.
Ao peso das pálpebras se junta a força do Sol nascente. Seus raios atingem a minha roupa, confeccionada com tecido não tecido, TNT, que faz lembrar uma lona ou cortina. Sofro com o calor. Se está quente agora você calcula sob o Sol do meio-dia do Noroeste Paulista.
09:00
A Festa da Mandioca está em sua 6ª edição e é um evento beneficente, organizado por voluntários ligados a instituições que cuidam de idosos, crianças e dependentes químicos em Pirajuí.
Uma hora brincando com as crianças e já estou zonzo. Também sinto uma espécie de crise de identidade: em pouco tempo, fui chamado de pelo menos 300 nomes diferentes: Mandiocão, Mandioquinha, Super Mandioca, Homem Mandioca e José Carlos, confesso que não entendi bem esse último.
O calor só piora e o corpo pede arrego, mas ignoro. Sou o mascote, tenho uma missão.
11:00
Nas barracas, vejo o deslumbrante desfile de iguarias. Vão das mais tradicionais – coxinhas, mandioca frita – às mais ousadas, como o já citado mandioqueijo e a Mandioca Ruffles. Chego à conclusão de que o mandioqueijo é o Paulo Coelho do mundo dos pratos com raízes tuberosas; um divisor de opiniões, talvez um incompreendido.
Tomo um copo de suco de mandioca e sinto parte do meu vigor voltar. Tropeço numa espécie de gárgula-mandioquinha e vou de cara ao chão. De volta ao desânimo.
13:00
A festa está no auge, lotada. Filas se formam em cada barraquinha, mesas são dispostas para as refeições e o cheirinho de comida domina o ar. Estou com fome, mas nunca fui tão disputado. Tiro fotos com todo mundo, dou vários abraços. Nem os políticos escapam do meu charme: sou puxado para uma pose com os figurões.
Paro pra comer uma mandioca frita (não me chame de canibal, dói… me considero mais um sobrevivente) e o sabor me lembra de uma curiosa história. É sabido que a mandioca é temperamental – só serve pra cozinhar se for plantada e colhida em condições específicas. Uma das mais críticas está no ato da colheita. Caso ocorra a flatulência (n. do e.: o peido) no momento da retirada da raiz, pode esquecer. A mandioca não cozinha.
15:00
Cantores sertanejos conquistam os visitantes – Lucas Akira e Fábio, uma dupla nipo-brasileira. Lucas, bonitão, me encara como se eu já estivesse cozido dentro de uma panela. Sua origem oriental me tranquiliza – comemoro o fato de ter negado o emprego como mascote da Festa do Sushi de Garça-SP.
A sanfona chora, assim como eu. Pra falar a verdade, não sei afirmar se é choro ou suor escorrendo. Arrisco um pas de deux mas, ao notar a estranheza no olhar alheio, caio num arrochão pesado. O suor já é impossível de ignorar.
Uma senhora me olha com desdém na fila dos banheiros. Ela parece não aceitar que uma mandioca utilize o banheiro masculino. Estamos em 2015 e a intolerância com raízes vegetais ainda é evidente na sociedade interiorana. Quando finalmente entro na cabine, percebo que molhei meu corpo de mandioca – o TNT nada fresco – no chão. A retirada da roupa é um suplício. Já se vão vinte minutos e ainda nem consegui começar. Ouço meu nome sendo chamado lá fora. Que fase.
17:00
A música vai parando e os convidados se dispersam. A festa parece alcançar seu fim. Sinto um misto de alívio com tristeza. Meu traje e eu somos um agora, como um simbionte, e tenho a impressão de que nunca mais seremos criaturas separadas novamente. Sinto uma gosma escorregar pela minha barriga… Seria uma mistura de suor e sangue? Não, era um pouco de sopa de mandioquinha que eu tinha escondido para fazer um lanche mais tarde.
O Sol começa a ceder e o fim de tarde está esplêndido.
Tudo foi um sucesso e a minha missão está cumprida. Mal consigo acreditar. Esboço uma sorrisa, mas uma triste lembrança me assola subitamente: amanhã ainda vou trabalhar no Festival da Jaca em São Felipe, BA. E eu reclamando da roupa de hoje.
Colaborou com texto e fotos:
O encarregado Mauricio
Foto de capa, uma cortesia de:
Alexandre
19/05/2015 — 13:37
Esta comovente Odisseia me levou para dezembro de 2001, quando por necessidades de ordem financeira, aceitei todo o tipo de trabalho na minha pequena Águas de São Pedro. Uma belíssima cidade, mas sem muitas oportunidades de emprego, principalmente se você é um maconheiro conhecido na Estância, era o caso.
Um dos trabalhos que aceitei foi de Papai Noel de Shopping. Aliás, o Shopping, que contava apenas com o térreo, um restaurante e 13 lojinhas, nem era bem um Shopping. Lá mamãe tem uma loja onde vende pijamas de excelente qualidade e roupas de bebê. Sabendo da situação do filho, deu ideia aos seus pares comerciantes para que colocassem um atrativo a mais no período de férias de verão: “Que tal chamarem o Lê para ser Papai Noel?”
Foram dois finais de semana, R$ 160,00, muito calor e muita criança. (moro em Águas de São Pedro, onde o muito as vezes não passa de 17).
Me identifiquei muito com a história do Mascote da Festa da Mandioca, primeiro por sermos interioranos e, segundo, por termos nos conectado com nossos personagens.
Guardo com carinho algumas fotos, principalmente com meus sobrinhos, hoje adultos que posso envergonhar na frente dos amigos com elas. (risos)
Era divertido andar pela única avenida do centro vestido de Papai Noel Cospobre (era muito magro e colocava travesseiros como pança), parar no costumeiro boteco, pedir um rabo de galo, puxar a barba postiça para baixo e me deliciar com o drink para abrir o apetite.
Parabenizo este sítio pelo belo e emocionante relato, digno de um SBT Repórter com certeza. Realmente fiquei tocado pelo relato e pude passear por tempos de minha tenra juventude, onde no final do ano, era tempo de ganhar dinheiro.
Obrigado.
funcionário Marcelo
19/05/2015 — 18:25
A família Homem Benigno agradece, caríssimo!
Marcelo B
21/05/2015 — 05:17
será que tb existe, pelo mundo afora, a festa do nabo!?