Foi você quem me fez assim

Basilio Bannwart: projetista da fé

Essa é uma imagem de Basilio Bannwart que tenho viva na mente, ainda no final dos anos 1980 e início dos anos 1990.

Era sábado e a casa de meus avós maternos, na baixada do Jardim América, estava repleta de filhos e netos – eu era uma dessas crianças correndo e brincando.

Em meados da tarde, chegava na casa um simpático senhor magro, de camisas de mangas curtas bem alinhada, de cabelos branquinhos penteados de lado e óculos de aro grosso.

Ele não precisava sequer bater palmas ou ser anunciado. Entrava, cumprimentava a todos e ia direto ao quarto de minha bisavó, Maria Zucon, à época nonagenária.

Sob o braço, trazia um livreto da liturgia bíblica da semana e um recipiente onde, com cuidado, carregava a Santa Hóstia.

No quarto da bisa, ele se sentava na cama ao lado, a cumprimentava e deixava que ela tocasse as calejadas mãos em seu braço.

Minha bisavó viveu boa parte da vida sem uma das vistas, perdida por complicações de glaucoma. Católica fervorosa, sem enxergar direito e com pouca mobilidade, durante seus últimos anos de vida, teve como único contato com a igreja as ondas do rádio, as mãos e a palavra de Basilio Bannwart.

E assim foi sua rotina para tantos e tantos enfermos. Basilio Bannwart era um homem de fé, um caso raro de pessoa que transmitia a bondade apenas com o olhar.

Basilio Bannwart
Em foto do início dos anos 2000: camisa de botão e óculos de aro grosso, sempre sorridente

Suíça, Indaiatuba, Pirajuí

A história da ampla e conhecida família Bannwart em Pirajuí tem início nas primeiras movimentações imigratórias da Suíça para o Brasil, ainda nos anos 1880.

Para ser mais exato, no ano de 1888, quando se formava o bairro Helvetia, uma colônia rural agrícola do município de Indaiatuba (SP).

Lá nascera o bebê Basilio, em 1921. De lá, grande parte da família se mudara para a zona rural das proximidades de Pirajuí, na bela e simpática fazenda Lagoa Bonita, nos arredores do distrito de Santo Antonio da Estiva.

A proximidade com a igreja parece ter nascido cedo, tanto que chega a frequentar o seminário, em Botucatu.

No entanto, foi na faculdade de Belas Artes, em São Paulo, que Basilio Bannwart encontra sua verdadeira vocação.

Formado em desenho, trabalha um tempo na área em Campinas, mas retorna ainda jovem para Pirajuí.

Por intermédio do pai, José Bannwart, recebe apoio para se dedicar a pequenos projetos residenciais na efervescente cidade, que ainda crescia.

Era um passo definitivo para vida do jovem recém-formado.

Basilio Bannwart, o projetista

Se os pequenos projetos residenciais marcaram o início dessa fase profissional da vida de Basilio Bannwart, obras de maior porte fizeram com que seu nome fosse eternizado nas marcas urbanas de Pirajuí e região.

Selecionamos aqui alguns projetos de destaque de sua trajetória.

Rádio Pirajuí

Na aguardada mudança dos estúdios da Pirajuí Rádio Clube (então Rádio Pirajuí) para a nova sede na Rua 9 de Julho (onde está até hoje), coube a Basilio Bannwart fazer os ajustes necessários e transformar o lar de algumas freiras do externato Santa Maria (atual Colégio Fundamental) em prédio comercial.

A mudança se deu em 1974 e a obra foi um sucesso.

Igreja em Pongaí

Uma obra marcante para Basilio Bannwart – e que até hoje é de enorme influência regional – está na estrutura da Igreja Matriz da cidade vizinha, Pongaí.

Projeto datado de agosto de 1960, a construção traz um estilo moderno para a época e uma beleza única, mantida até hoje como um cartão postal do município.

Basilio Bannwart
O projeto da Igreja Matriz nos anos 1960 e, em seguida, a foto como cartão postal de Pongaí

Ainda no âmbito da religiosidade, é um projeto de Basilio Bannwart o Cruzeiro do Cemitério Municipal de Pirajuí, uma obra marcante.

Ampliação da Industrial

Outro projeto de sua autoria de enorme impacto na história de Pirajuí foi a complexa reforma e ampliação da Escola Estadual Professora Maria Angélica Marcondes, antiga Industrial.

Entre os anos de 1965 e 1970, Basilio Bannwart se dedicou de corpo e alma a esse projeto. Ele não apenas desenhou o que seria feito, mas administrou pessoalmente cada etapa da grandiosa obra.

Raridade: o projeto de ampliação da Industrial, as adaptações para o tão sonhado ensino profissionalizante

Graças aos seus esforços, a escola ganhou dez novas salas de aula, o prédio da diretoria e todo um setor que ele tinha forte admiração: o laboratório de Física, Química e Biologia, e as saudosas oficinas de Mecânica e Marcenaria.

O ex-diretor Miguel Mourão, já falecido, guardou um capítulo do seu livro de memórias para agradecer Basilio Bannwart.

Oficina de mecânica foi um dos sonhos de Basilio e Mourão, tirados do papel na ampliação da escola

Mourão escreve: “A gratidão ao Senhor Basilio por certo estará sempre no coração de gerações que já passaram e daquelas que estarão procurando a Escola, em busca de uma atividade profissional aliada à realização pessoal”.

O legado

A jornada profissional teve o devido reconhecimento em 2017. O menino quietinho da roça, que adorava a igreja e foi estudar desenho, passou a dar nome à Unidade Posto de Serviço Basilio Bannwart, do CREA-SP, em Pirajuí.

A homenagem ao projetista/construtor foi marcada por uma solenidade que reuniu familiares e autoridades locais e regionais.

Casado com Hilda Pfeifer Bannwart, teve seis filhos e muitos netos. No mandato do prefeito Sergio Assunção Toledo Piza, nos anos 1960, foi eleito vereador por uma legislatura.

Faleceu em setembro de 2015, aos 94 anos.

Já nonagenário, relaxando em casa, em foto de família

Discreto, simpático, educadíssimo, sorridente. A mesma mão delicada que depositava cuidadosamente a hóstia na boca de minha bisavó, desenhava formas sólidas e perenes, que marcariam a história visual de toda uma geração.

Acreditava muito na educação de qualidade (fora, também, professor). Esse seu objetivo foi colocado em prática durante a reforma da escola Industrial, com a criação das oficinas.

Já imaginou quantos pirajuienses aprenderam um ofício e, enfim, a ser alguém na vida, graças a persistência de Basilio Bannwart?

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