Foi você quem me fez assim

Quem daí dançou a Quadrilha Country na escola?

Nunca consegui saber se esse era um costume de Pirajuí ou se o Brasil inteiro também tem essa tradição da dança da Quadrilha Country nas festas juninas escolares. Bom, se isso é tradição na sua cidade, conte aqui nos nossos comentários. Vou contar como é (ou, pelo menos era, na versão pirajuiense).

No colégio, durante toda minha infância e adolescência, quando chegava o mês de maio, principalmente a segunda quinzena, as aulas passavam a ser interrompidas pela música alta que vinha da quadra esportiva. “Xi… Já começaram os ensaios das quadrilhas juninas”, reclamava a professora.

As festas juninas da minha época eram uma junção de barracas de comida, bebida, correios elegantes sendo distribuídos em cartolina vermelha (uma vez ganhei um e estava escrito “Jesus te ama” dentro – apesar de ter uma baita consideração pelo Nazareno, fiquei um pouco desapontado, confesso), bombinhas, bombonas, rojões, buscapés e “biribinhas”, que em alguns lugares são chamados de estalos de velha ou, o que em nosso caso era mais comum, peido de véia (coitada da velha, às vezes tinha comido repolho ou batata-doce. Nunca saberemos).

Ao centro da festa, na quadra esportiva, desde o início da noite, aconteciam as danças. Como os colégios reuniam todas as séries do Ensino Fundamental ao Médio, a primeira dança era da criançadinha, que mal sabia o que estava fazendo. Sempre com temática caipira, noivinho e noivinha, com a professora ao centro coordenando os pequenos. Alguns deles demoravam quase a música inteira para entender que estavam dançando uma tradição junina e que eles tinham que fazer os movimentos previamente ensaiados, etc. Alguns pais costumavam brigar e se acotovelar para ter a melhor visão do seu herdeiro. As fotos eram tiradas exclusivamente pelos fotógrafos profissionais e vendidas posteriormente em suas lojas, penduradas em um varal. Hoje, com certeza, a dança deve ser inteiramente filmada pelo zoom dos smartphones dos pais e compartilhadas à exaustão nos grupos de WhatsApp de família, consumindo os pacotes de dados do Tim Controle.

Após a 5ª série, o ambiente caipira, o “balancê” e o “olha a cobra”, saem de cena – as pessoas vão voltar a dançar quadrilha caipira apenas na Melhor Idade (antiga 3ª Idade). Na adolescência e juventude, ao menos em Pirajuí, era hora de crescer, virar adulto na quadra, dançando a magnífica Quadrilha Country.

A maravilhosa Quadrilha Country

Repito: não sei nem como e nem de onde ela surgiu. Em meio a um ambiente caipira, do homem interiorano e os costumes da roça, eis que os ianques surgem, em seu estilo mais rústico, o cowboy. Na Quadrilha Country não tem padre, não tem noivinho, nem roupas cheias de remendos. Camisa larga, calça WRANGLER (pronuncia-se rângler), botinas, fivelas e um chapelão compõe o uniforme.

Os cowboys mais bem vestidos ocupavam os primeiros pares da dança. O casal mais alto puxava a fila. Geralmente, ao menos na minha época, o casal que puxava a Quadrilha Country carregava nos ombros o fardo de serem os mais populares da escola, quase sempre. A popularidade ia diminuindo no decorrer da fila e o final da turma – que era o meu caso – era formado pelos cowboys que só entraram lá para dar número ou via concurso público.

A música é um capítulo especial. O ritmo da dança era sempre embalado pela canção The last county song cantada por Tom T. Hall. Uma toada bem gostosa, com uma voz em um inglês caipirão puxadão, que era gravada em uma fita cassete e repetida trocentas vezes até dar, sei lá, quase meia hora de dança. Saca só a canção:

 

Lembro das professoras de educação física, Dona Judite, Dona Dadá, Dona Marilda, Dona Regina, Prof. Davi, entre tantos outros mestres, correndo de um lado para o outro com as fitas gravadas nas mãos para os intermináveis ensaios. Era bem evidente quando a música acabava, rolava um fade out, um breve silêncio, e logo começava de novo.

Depois de um tempo, a faceta conservadora da Quadrilha Country passou a receber algumas mudanças. Receberam outra música, pois daí a turma da tarde e da noite também poderia dançar uma versão do espetáculo.

Acho que foi em 1995 que o Rednex (uma banda country sueca) lançou Sex & Violins e passou a ocupar as paradas de sucesso. Nessa época, se não me falha a memória (me corrijam se eu estiver errado que eu mudo aqui, por favor), o Marcelo Moreira, ainda no E. E. Olavo Bilac, criou junto com o pessoal da sua classe a Quadrilha Country Dance. Nossa… Foi uma coqueluche. A mesma indumentária country agora recebia tons do remix e da música eletrônica.

Alguns anos mais tarde, no E. E. Alfredo Pujol, começaram a surgir as danças country só femininas e só masculinas – essa última, em certo ano foi apelidada de Cueca Street Boys e fez bastante sucesso.

Em épocas pré-Instagram, Facebook e InstaStories, era sensacional curtir o embalo da Quadrilha Country nas festas juninas. O número era o rei do espetáculo. Mesmo o pessoal que não curtia o estilo ou o ritmo, os malvadões do rock, até eles paravam para curtir a dança, ver os cowboys gritando e vivendo o clima do Velho Oeste. Ver aqueles que até pouco tempo atrás eram crianças, se tornarem adultos, bem no meio da quadra da escola, em plena festa junina de Pirajuí!

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