Foi você quem me fez assim

Bigurrilo, o caminhão, os saqueiros e a Cooperativa

Entender a formação e a evolução da história de Pirajuí significa, obrigatoriamente, conhecer um pouco do papel da Cooperativa dos Cafeicultores da Média Noroeste nesse percurso – e, dessa narrativa, o Toninho Bigurrilo compõe parte importante.

A Cooperativa surgiu em 19 de julho de 1959, com objetivo de atender os produtores de café de Pirajuí e região.

Seus fundadores foram José Maria Guedes Meireles, Carlos Ludgera Pereira da Rocha, Hélio Tobias Costa, Luciano Inforzato, João de Souza Meireles Neto, Gino Marangon, Odilo Bannwart, João Pfeifer, João Barbante, Torquato Montalvão, Tessalonico B. Nascimento (Observação: não sei se os nomes estão grafados corretamente no registro que busquei, por favor, me corrijam).

Desde seu surgimento, tem sua sede e administração basicamente na entrada da cidade na rua Barão do Rio Branco, número 553 a 655, ao lado da rotatória do Cristo.

À época, Pirajuí ainda ostentava o título de uma das maiores produtoras de café do Brasil e essa cultura também movimentava as cidades de Guarantã, Balbinos e Cafelândia.

Inauguração do novo prédio da Cooperativa nos anos 1970

Os saqueiros

Falar da Cooperativa em Pirajuí vai muito além de rememorar os grandes produtores rurais e membros da diretoria… Com tantos anos em funcionamento, é fundamental lembrar das pessoas que fizeram e fazem aquele espaço operar diariamente.

Além dos funcionários administrativos, nem tenho como citar nomes, mas me recordo da simpática Dona Rosa Teodoro, meu compadre Anderson Braga e, é claro, meu saudoso avô Antônio Marques, que passou toda a sua vida trabalhando na Cooperativa – em especial, na balança; há também outro grupo muito especial de trabalhadores, os saqueiros.

Trabalho pesado, volumoso e que exige muito fôlego. A figura do saqueiro é essencial para a movimentação diária das sacas de café no local.

É interessante não confundir com aquele que “faz e costura” sacos de estopa. Cabe a eles fazer a chegada e a saída da carga. Sempre com muita resistência – uma vez me contaram que é jeito, experiência. Mas ao ver um saqueiro trabalhando, meu amigo, saiba que também tem muita força envolvida, acredite!

Eles estão sempre por ali na avenida, nos bancos da Rodoviária, esperando o próximo momento de trabalhar, sempre sorridentes e brincalhões, lembro do Luizão, do Bini, do Gone, o Niu, o Chico, o Gone “Corredor”, o Zé “Lobinho”, entre tantos e tantos outros.

Uma profissão que atravessa as eras e que, em Pirajuí, foi a responsável por tantas belas histórias e famílias inteiras sustentadas e formadas – inclusive a minha.

Para transportar o esforço feito pelos saqueiros, está o caminhão e, evidentemente, seu condutor. É aí que entra o homenageado de Homem Benigno de hoje.

Antonio Felício, o Bigurrilo

Toninho Bigurrilo

Há dois anos, no dia 30 de junho de 2017, Antonio Felício nos deixava, aos 70 anos, após longa batalha contra problemas cardiovasculares.

Apesar de fazer parte de conhecida família em Pirajuí, foi seu apelido que o fez extremamente popular, em praticamente todos os círculos de nossa região: Bigurrilo.

Sua infância e juventude foram vividas nas principais ruas da cidade, nasceu na Campos Salles e viveu por muitos anos na Riachuelo.

Já casado com Maria Pagliacci, foi morar também na Rua Voluntário Silvano de Lima, onde viveu até seu último dia.

A trajetória de Bigurrilo esteve atrelada quase que totalmente ao volante. Sua atividade, seu ganha pão, o sustento da família de três filhos, tudo vinha de seu esforço na boleia.

Era o que amava. Era o que sabia fazer, com muita habilidade!

Puxou cana na região da Água Quente e Usina Miranda – “sempre brincalhão, gozador”, meu pai se recorda. Poucos anos mais jovem, ele se lembra de ver Toninho todo molecão já no volante.

Depois, trabalhou muitos anos para o, também já falecido, Irineu ou “Gordo” Fabrício. Trabalhou no caminhão, é claro!

Após muitos anos nessa atividade, conseguiu conquistar o sonho de comprar o caminhão que trabalhava. O MB 1111, que literalmente fez história na sua mão.

Foi com ele que passou a atuar por tantos e tantos anos nos mais diversos serviços solicitados, marcando época também na Cooperativa, onde era figura carimbada ao lado dos amigos saqueiros, no local em que ficaria até se aposentar.

Amizade: Bigão, Pedro “Bolinha”, Neu Simensatto e Pagliacci, em 1992

Simpatia e bom humor

As lembranças que tenho do Bigurrilo são as melhores possíveis. Quando passamos a conversar mais, ele já era um tiozinho simpático, careca no topo da cabeça e com cabelos grisalhos sobre orelha.

Tinha um humor certeiro. Era impossível não dar risadas de seus comentários bem colocados.

Quando soube quem era meu avô então, ficou ainda mais feliz em notar que se tratava de gente conhecida – meus dois avôs, aliás, como disse, ele conhecia todo mundo.

Lembro de uma passagem muito marcante. Sou muito amigo e contemporâneo de seus filhos, em especial do caçula, Gabriel “Casquinha” – que hoje vive em Rio Verde (GO).

Estávamos no Clube de Campo, fazendo um churrasco e caiu aquele temporal. Vindo no caminho, em meio aquele barro todo do trajeto até o local, estavam dois amigos de infância, inseparáveis: Toninho Bigurrilo e Irineu “Neu” Simensatto.

Com Neu no volante e Bigão de co-piloto, a cena que vimos foi inacreditável. Eles saíram do asfalto no Gigantão e foram naquela barreira toda até o Clube de Campo, com um carro branco e chegaram com ele completamente limpo! Era coisa de cinema: não havia um respingo de terra molhada nos paralamas sequer.

“Tem que ir no rumo do barro”, ensinou.

Outra cena que tenho sempre à mente foi quando do nascimento de um de seus netos, Bernardo – hoje já um meninão que vai à escolinha em Rio Verde (GO).

Vendo todos paparicando o praticamente recém-nascido ao redor, Bigurrilo era simples e direto: “que monte de colo é esse? Para com isso, criança se cria solta no chão! É no chão que eles crescem e se desenvolvem”.

E assim Toninho viveu sua vida. De forma simples e direta, sem meias palavras. Nos ensinou muito e hoje, é claro, nos deixa uma saudade bem grande, do tamanho e do peso de um caminhão carregado de sacas de café!

Família: Maria, Bigão, Gabriel, Adriana e Marco Antônio “Bozó”

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