Foi você quem me fez assim

O dia em que Pirajuí parou o Brasil

No dia 20 de junho de 1963, Pirajuí parou o Brasil – ou, ao menos, quase fez isso.

Cada vez que buscamos um pouco mais dos detalhes da história da nossa cidade, mais fatos surpreendentes aparecem do passado glorioso da Rio do Peixe Dourado.

Dois jornalistas saíram de São Paulo rumo a Pirajuí para fazer uma cobertura especial de algo que acontecia na região Noroeste do estado.

O repórter Hélio Siqueira e o fotógrafo Luiz Cerasoli fizeram a, naquela época, nada fácil viagem, para cobrir os efeitos de uma decisão do prefeito e dos agricultores de Pirajuí, que refletiria em toda região, todo o Estado e, acredite, em todo o Brasil.

Mais de mil agricultores estavam nas ruas da cidade. Na Treze de Maio, era possível ver veículo pretos, com homens da Força Pública, de Bauru, mobilizados para conter possíveis tumultos.

Capa do Diário da Noite de 21 de junho de 1963, São Paulo – a Rebelião do Café de Pirajuí é a manchete

Mas o que aconteceu?

Toda mobilização que alardeou todo o país e saiu na capa do jornal Diário da Noite, na edição de 21 de junho de 1963, havia sido causada por um anúncio do então prefeito de Pirajuí, Sergio Assumpção Toledo Piza.

Piza foi prefeito de Pirajuí entre 1960 e 1963, depois entre 1964 e 1965.

Quando o jornalista perguntou a Piza o que estava acontecendo, ele disse que “a lavoura de café deu seu ‘grito de guerra’ e iremos até às últimas consequências com o Governo Federal”.

A ordem que partiu de Pirajuí era a chamada Rebelião do Café. Para contrariar uma medida considerada arbitrária contra os cafeicultores, vinda de Brasília, do Governo Federal, o prefeito mobilizou diversas camadas da sociedade para protestar.

Ex-Prefeito Sergio Piza, em foto aos 86 anos – na ocasião, era homenageado por seus feitos na pecuária do Brasil. Uberaba (MG)

Piza autorizou piquetes nas entradas e possíveis saídas de Pirajuí. Nenhum caminhão transportaria carga nenhuma – nem café nem gado –, nem os trens trafegariam pelos trilhos da noroeste.

E mais, os bancos fecharam, o então vibrante comércio local baixou as portas – sequer as telefonistas atenderam as chamadas.

Naquela quinta-feira, uma palanque estava montado e mais de mil trabalhadores rurais aclamavam representantes que falavam sobre o movimento. Ali estavam, além dos vereadores, representantes de cafeicultores de Araçatuba, Birigui, Reginópolis, Garça, Guarantã e Bauru.

O movimento que tomava Pirajuí como exemplo já estava, também, confirmado em outras localidades da Alta Paulista e grande parte da Sorocabana. De acordo com a reportagem do Diário da Noite, a paralisação que nascia na Rio do Peixe Dourado iria se espalhar por todo Brasil. Segundo Piza, “onde quer que exista sequer um pé de café plantado”.

Os motivos do protesto dos cafeicultores

O movimento que se iniciou quando Pirajuí parou o Brasil estava diretamente ligado às medidas anunciadas pelo Instituto Brasileiro do Café (IBC) para a safra 63-64, autarquia do Governo Federal que existiu entre 1959 e 1989.

Em nome dos cafeicultores, o prefeito Sergio Piza, que também era fazendeiro de café – veio de São Paulo para Pirajuí viver nas fazendas de seu pai, Alcebíades Toledo Piza –, pedia reajuste no valor pago por saca anunciado pelo Governo.

Os cafeicultores exigiam valor mínimo de 10 mil cruzeiros por saca de café; o IBC anunciara valor máximo de 8 mil cruzeiros.

Outra medida que desagradou os produtores foi a decisão do IBC de valorizar no mercado o café tipo 5, que é o café escolha, com qualidade inferior para a exportação, em detrimento do café tipo 3, que era o mais valorizado em território internacional.

Lutavam também contra um anúncio de que o Banco do Brasil, segundo o IBC, só forneceria novos empréstimos a agricultores que não tivessem nenhuma outra dívida com a instituição financeira – o que, na ocasião, seria um duro golpe para a continuidade da lavoura para muitos fazendeiros de café.

Banco fechado em Pirajuí. Ninguém trabalhou, o comércio não abriu e nem as telefonistas atendiam às chamadas. (Se não me engano, hoje esse é o prédio da Lotérica, certo?)

Por que o Brasil escutava Pirajuí?

O anúncio de Sérgio Piza mobilizou até a imprensa paulistana, de um jornal muito importante, para fazer a cobertura dos piquetes e da paralisação geral, que nascia no município.

O Diário da Noite era um dos jornais do império formado desde os anos 1920 por Assis Chateubriand, o Chatô, e seus Diários Associados.

Naquela época, inclusive, a publicação já vivia os seus últimos anos de circulação – viria a ser extinta anos depois, junto a outros veículos diversos do grupo.

Mas por que Pirajuí ostentava tanta relevância? Naquele momento, a cidade tinha muita representatividade no segmento cafeeiro – em 1963, atravessava uma crise que culminaria com a decadência dessa lavoura local. Ainda assim, possuía 6 milhões de pés de café.

Em 1943, quando recebeu o título de “capital mundial” desse produto, Pirajuí tinha a impressionante marca de mais de 40 milhões de pés de café.

Para se ter uma ideia do tamanho disso, no ano de 2016, o agricultor João Faria da Silva, considerado o maior produtor de café do mundo, reunia 18 milhões de pés.

Infelizmente, pelo menos até o momento, não consegui encontrar qual foi o desfecho dessa história e dos esforços do então prefeito Sergio Piza.

Veículo e homens da Força Pública de Bauru garantindo a segurança na Rua Treze de Maio – mais de mil trabalhadores protestavam. (Esse é o prédio da Charm Informática, estou certo?)

Poucos dias depois, no dia 25, o Diário da Noite anunciava que a Rebelião do Café, iniciada em Pirajuí, já estava em fazendas e trabalhadores rurais de grande parte do Paraná.

Ao que sabemos, por aqui, nos anos seguinte, Piza foi para Bauru, onde criou e presidiu a Exposição Agropecuária da cidade, a até hoje famosa ExpoBauru. Depois, ainda como pecuarista, criou o Programa de Leilões a ajudou a difundir essa cultura por todo o Brasil.

Nos anos 1970, assumiu a presidência da Associação dos Criadores de Nelore do Brasil e fez muito pela promoção da raça nelore em todo o país. Pelas informações que tenho, hoje está com 88 anos, mora em Uberaba (MG), casado com a uberabense Maria Cândida da Rocha Miranda, com dois filhos e três netos.

Viva Pirajuí!!!

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