Eu nasci nos anos 1980 e não fui para a escola ainda tão pequenino como estamos acostumados nos dias de hoje. 

Nas minhas primeiras aulas no Ensino Fundamental do Bilac (e, posteriormente, no Pujol), lembro que quando falávamos sobre Pirajuí, principalmente no mês de aniversário da city (Março), ouvia o nome de Tito Madi.

Tito Madi é o mais famoso filho de Pirajuí”. 

Tito Madi saiu jovem de Pirajuí e conquistou o mundo”. 

Essas eram as frases que estampavam cartazes e cadernos na escola em minha infância e adolescência, ao lado do grande Picolé, Carmem, Maria Zilda, Dr. Zé Pedro, etc. Como sempre gostei muito desses assuntos, às vezes me perguntava: mas cadê esse tal de Tito Madi que nunca mais voltou para cá?

Claudinho e a Oficina de Cultura

Quando eu já chegava na juventude, como dizem que “boi preto procura boi preto no pasto”, eu e meu grande amigo Samir Mereb (ele mesmo, o homem por trás das delícias da D20 Hamburgueria) conhecemos outro figura: Cláudio Antonio Cândido, o Claudinho.

Poço de cultura, amante da música, do teatro e, principalmente, Pirajuí, Claudinho nos contou um pouco mais desse “tal de Tito Madi“. 

O mito tomou forma. Pela primeira vez ouvi suas músicas. Todas lindas, diferentes, solenes, apaixonadas (com aquele tom único de sofrimento). Era histórico, idolatrado. Roberto Carlos (o Rei) era seu fã, Djavan idem. Morou com João Gilberto – chegou a levar uma “violãozada” na cabeça do temperamental colega de quarto. Quanta história!

Integramos a Oficina de Cultura São Sebastião do Pouso Alegre e ali fizemos teatros (como o que narrei nessa história doida sobre a Via Sacra) e exposições. 

Nas exposições: mais Tito Madi! Suas músicas, suas letras, suas histórias e passagens – algumas até um tanto mitológicas.

Tito Madi em um programa da saudosa Hebe, quando perguntado onde havia nascido, disse que: “Em Pirajuí, a cidade que Bauru fica perto”.

Nessa época também, o Claudinho nos mostrou a raríssima canção do Chauk Madi sobre Pirajuí… (Tito viria a escrever e gravar mais recentemente nova homenagem: Outra Canção Para Minha Terra)

Pirajuí eu lhe ofereço / Esses versos que o meu coração..

Linda, clássica, incomparável. Um hino de amor à Pirajuí 

Bonadio e Pavanato

No início dos anos 2000 a história de Pirajuí com Tito Madi ganhou um novo e especial capítulo. 

Eu já estava cursando a faculdade de jornalismo, visitando diariamente a redação do semanário O Alfinete, à época sob a tutela do meu grande e saudoso amigo Marcelo Pavanato. 

O assunto Tito Madi era recorrente. Soube ali que havia uma “certa” mágoa do cantor com sua terra natal. Algum mal entendido do passado teria gerado esse distanciamento do conterrâneo.

Em 2004, no Sesc Bauru, com Marcelo Pavanato aparecendo sorridente ao fundo

Nesse momento, entra em cena uma figura central quando o assunto é a memória de Tito Madi. O pirajuiense radicado em São Paulo, Francisco Bonadio Costa, nos últimos 15 anos foi um misto de fã número 1, biógrafo, assessor direto, assessor de imprensa e relações públicas do cantor e compositor. 

A mistura Pavanato e Bonadio foi explosiva. Tito Madi era um assunto central e estava quase sempre presente nas páginas do jornal – uma capa clássica o chamava de “Um ilustre esquecido”. 

A provocação rendeu frutos. O então vereador (hoje vice-prefeito) Wanderley Ferreira Grejo, o Professor Wandão, em um esforço político e de relacionamento, conseguiu algo inédito para a minha geração!

“Tito Madi vai visitar Pirajuí!”

Aconteceu! O sonho ia se tornar realidade. Após décadas distantes, agora com apoio dos vereadores e da prefeitura – e o devido suporte do semanário O Alfinete –, Tito Madi ia voltar à terrinha. 

Foi uma festa. Madi chegou todo elegante, sempre muito bem vestido, com camiseta polo por dentro da calça. Andou por Pirajuí com um olhar apaixonado, um sorriso muito sereno e uma atenção ímpar.

Olhava nos seus olhos. Era Tito, mas era seu amigo pirajuiense, ao mesmo tempo. Era altivo, mas humilde, deixava-se aproximar. 

Almoçou no Castelinho, visitou as escolas, foi homenageado por crianças, por autoridades, por tudo mundo. O ex-prefeito Neguito (in memoriam), o então vice Jardel e Dona Sônia deram todo o apoio para a passagem.

Como foram felizes aqueles dias em Pirajuí. Novamente a Oficina de Cultura reaparecia com destaque: Claudinho, agora acompanhado de membros mais musicais, Adelita Xavier, Marcelo Volpato, Matheus Pagliacci. 

Em São Paulo na Associação Paulista de Medicina, ao lado dos amigos Jorge Chade e Gabriel Jareta 

Tito Madi, o Grande Tito Madi, estendia a mão aos talentosos músicos pirajuienses – ele já esteve no lugar deles, na Rua 7 de Setembro onde nasceu, ouvindo o pai tocando seu alaúde. 

Fez um show inesquecível no Parque Clube. Vestia um terno branco, acompanhado do magnífico pianista Haroldo Goldfarb. 

No público, todas as gerações de pirajuienses, olhavam sem acreditar na apresentação que se desenrolava no palco do salão social do PCP. Maurinho Soares, que também nos deixou ainda esse ano, lá estava também, realizado. 

Até hoje me pego pensando em como aqueles poucos dias foram mágicos. Estive ao lado de Tito Madi em Pirajuí o tempo todo (eu era repórter da Pirajuí Rádio Clube). 

Tito passou a assinar uma coluna semanal no semanário O Alfinete. Lá contou belíssimas histórias – me disse que gostaria de fazer um livro dessas crônicas, quem sabe não acontece, né?

Acompanhei Tito Madi em vários shows após essa ocasião. Me mudei para São Paulo e ouvi o peso de sua voz na Capital.

Vi o homem que morou na Estiva Grande deixar paulistanos apaixonados em um show sublime na esquina da Rua Aurora, na antiga Boca do Lixo em SP. 

Ano passado, mais uma vez, telefonei para o Bonadio (que já citei lá em cima) e pedi o telefone de Tito Madi. Estava passeando no Rio de Janeiro e pensei que seria uma boa oportunidade para gravar alguma coisa com nosso ídolo maior. 

Tito atendeu. E adorou a ideia!

Em seu apartamento, em uma manhã inesquecível de 2017 

Foi uma manhã inesquecível no Humaitá. Mesmo debilitado, foi carinhoso, atencioso, espetacular. Ainda carregava sua elegância, aquele tom solene que só os gentlemen possuem. Tratou minha esposa muito bem, ela ficou encantada. 

Hoje recebi pelo WhatsApp a triste notícia da morte de Tito Madi, aos 89 anos. 

Quase como num desses filmes feitos para emocionar, fechei os olhos e voltei para aqueles dias da visita de Tito Madi em Pirajuí. Todos sorrindo, felizes da vida, ao lado do nosso maior ídolo. Claudinho emocionado, Pavanato com aquele seu jeitão de missão cumprida, Bonadio como sempre um guardião ao seu lado… 

Foram tantos sorrisos para Tito… E ele, mostrava uma gratidão sem fim. Estava na sua Pirajuí, acolhido de braços abertos – e depois desse dia, ainda voltaria outras vezes, sempre sob muitos festejos. 

No seu apartamento, ano passado, me disse que assim que saísse da cadeira de rodas, ia passar uns dias na terra natal. 

Eu lhe disse: “Vá sim, Tito. Vai ser muito bem recebido. Você é um herói pirajuiense”. 

Ele deu aquele seu sorriso. 

Vá em paz, Tito. Obrigado.